Valentim Loureiro avisou a Polícia Judiciária, durante uma busca no caso "Quinta do Ambrósio", de que nunca seria encontrado um alegado contrato-promessa relativo a um suposto crime de burla, revela o seu ex-assessor num livro publicado na próxima semana.
O episódio aconteceu a 4 de Maio do ano passado, na Câmara de Gondomar. Em plena investigação do caso "Quinta do Ambrósio" - um negócio de venda de um terreno à STCP que gerou lucros de três milhões de euros a pessoas próximas do major - as autoridades procuravam um contrato que, na versão da filha da proprietária do imóvel, teria sido assinado para venda à autarquia no pressuposto de não ter capacidade construtiva.
"Meus amigos, eu sei o que vocês procuram, mas fiquem desde já sabendo que não existe disso aqui em Gondomar. Nunca existiu. Mas, mesmo que tivesse existido, já tínhamos deitado fora, não acham?", avisou o major, que sempre negou ter enganado a família proprietária e a existência do documento.
A revelação é feita por Nuno Santos, assessor da autarquia entre Fevereiro de 2005 e Março passado, no livro "A varinha mágica de Valentim Loureiro", a publicar na próxima terça-feira, que narra episódios ocorridos com o major durante o Apito Dourado, e também da sua vida política - como o conflito com o líder do PSD, Marques Mendes.
Apesar de não ter sido encontrado, o Ministério Público dá como assente a sua existência e considera ser uma das bases do crime de burla agravada pelo qual o autarca e elementos próximos acabaram acusados. O terreno foi comprado por 1,074 milhões de euros e, em menos de um ano, vendido por quatro milhões à STCP.
As mais-valias foram repartidas através de contas "off-shore", entre o vice-presidente de Valentim, o filho, Jorge, e o advogado Laureano Gonçalves. A compra do imóvel acabaria por ser declarada pelos três às Finanças, mas somente após buscas da PJ ao BPN - três anos após a transacção.
Para dar como assente a existência do documento, o MP apoia-se nas declarações da filha da idosa proprietária do terreno, que o assinou, e também nas palavras da irmã desta, que chegou a ver o contrato mostrado num encontro. O documento, porém, acabou por desaparecer, alegadamente durante negociações com advogados.
No livro, o ex-assessor conta ainda que o arguido fez com que os inspectores da PJ saíssem do Salão Nobre da Câmara, onde organizavam o material recolhido durante as buscas, que visavam também outros processos.
"'Meus amigos, peço desculpa por interromper o vosso trabalho, mas eu vou dar aqui uma conferência de imprensa, daqui a pouco. Não demora. São só uns minutos'. Um deles, com cara e bigode de chefe e a aparentar evidente falta de paciência, disse: 'Nós tiramos isto daqui…' '- Não é preciso. Até podem continuar a trabalhar. Eu ponho-me aqui à frente, falo de pé e vocês continuam aí atrás sentados a trabalhar. As televisões gostam", conta o ex-assessor, citando o que ouviu de Valentim. "Não faça isso, ó major", ainda disse um inspector. Mas não lhe deu ouvidos.
Quase ano e meio depois, o político acabou por ser acusado no processo da "Quinta do Ambrósio" e no caso da construção do complexo do Rio Tinto - uma obra cujos concursos formais indiciam que a cobertura foi feita antes dos alicerces.
Fonte: Jornal de Notícias